domingo, 26 de fevereiro de 2012

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Gotas da India




Nos restaurantes da Índia - a menos que se queira passar duas ou três horas - é aconselhável pedir tudo ao garçom de uma só vez: entrada, prato principal, bebida, sobremesa, chá ou café. Incluir o pão também. E, de preferência, a conta. Se algo não vier na ordem do pedido, ou simplesmente não vier, faz parte do menu.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

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Gotas da India




Na Plantação de Especiarias em Goa - Tropical Spice Plantation - dentre muitas coisas interessantes, aprendemos que a pimenta mais picante da Índia leva o sugestivo nome de piri piri. Para os portugueses piri piri é sinônimo de pimenta malagueta. Possivelmente, o piri piri indiano tem mais a ver com o “piriri” brasileiro do que a gente já sabe.

Goa: Tropical Spice Plantation
Piri piri: pimenta mais picante da Índia


sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

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Gotas da India



Os indianos quando falam inglês, em geral, trocam f por p, sh por s. 

Breakfast é breakpast, office é oppice, fifth é pípit, shop é sop, english é ingliss, finish é piniss, she é si, até Shiva é Siva. 

Inglês na Índia é na base do “Decifra-me ou te devoro”.


quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

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13. De Colombo a Madurai: nossa porta de entrada da Índia

Embarcamos em Colombo às 4h da manhã rumo a Madurai, estado do Tamil Nadu, Sul da Índia, com conexão em Chennai: 
- Our luggage goes directly to Madurai? - indagamos no balcão da Jet Airways. 
- Yes, sir – respondeu-nos um dos atendentes.
Numa demonstração de que aprendemos direitinho a lição de nossa guia cor-de-rosa - “nunca peçam informação só para uma pessoa, no mínimo cinco!” - reformulamos a pergunta a outro atendente: 
- So, the flight is to Chennai but we'll take our luggage at Madurai, right?
- That's right, sir – respondeu-nos com simpatia. E olhando nossos passaportes, disse sorrindo: 
- From Brazil... - E bom de prosa como seu povo, logo puxou conversa: 
- Did you enjoy Sri Lanka? 
- Oh, yes, yes! - respondemos prontamente - Beautiful country, people very nice, very very friendly... we've loved a lot... we want to come back – retribuímos-lhe o sorriso. De quebra, ofereceu-nos, sem que lhe pedíssemos, assentos na porta de emergência:
- More space for your legs – disse com a preocupação de um amigo, estendendo-nos os cartões de embarque, indicando-nos o portão.
- Istuti, istuti – agradecemos a gentileza em cingalês. Ele abriu ainda mais o sorriso, e num aceno de mão desejou-nos boa viagem. A despedida do Sri Lanka não poderia ter sido diferente: os cingaleses que encontramos são assim, simples, simpáticos e gentis.


O voo foi tranquilo e rápido, uma hora e meia depois, aterrissávamos na Índia, de mãos dadas:
- Agora é pra valer! Chegamos à Índia! Estamos na Índia... na Índia! - eu repetia como que não acreditando, apertando sua mão, um beijo no rosto, o tranco do avião tocando o solo indiano nas asas de nossa imensa euforia. Momento de muita emoção, alegria mesclada de apreensão, frio na barriga. 
- Indinha! Indinha – repetia ele no meu ouvido. Recordamos os meses de preparação da viagem, desde a promessa feita no Egito: nossa próxima grande viagem será à Índia. Depois, vieram a leitura do livro do Carrière – Um olhar amoroso sobre a Índia – a compra do guia, o traçado do roteiro – quais cidades visitar, quantos dias aqui, quantos ali? - o pedido de visto, o vai e vem de passaportes Rio-São Paulo, Rio-Brasília, os incontáveis telefonemas, a compra da passagem, as reservas de hotel, carro, trem, os e-mails enviados, as respostas que não vinham, as alterações, incertezas, noites insones - adicionam-se as providências tomadas em relação à casa e aos cuidados com o gato. Tudo isso trazido à lembrança ganhava corpo naquele momento, fincava os pés no solo da Índia.

Chennai, antiga Madras: formulários preenchidos, longa espera na fila da imigração. A funcionária, rechonchuda, sari azul, folheou os passaportes:
- Oppice – murmurou apontando sem muita motivação para uma porta no fundo.
- Excuse-me? - indagamos sem entender.
- Oppice – repetiu burocrática.
Oppice era office. Alguns dias depois fomos entender o porquê: os indianos, em geral, trocam f por p. Dirigimo-nos ao tal oppice onde um senhor magro, óculos e bigode, fazia anotações sentado à mesa coberta de cadernos e formulários espalhados. Aleatoriamente, sem tirar os olhos do seu papel, atendia os estrangeiros sem respeitar a ordem de chegada. Nossa guia cor-de-rosa bem nos ensinou: Na Índia eles não fazem fila... vão se acostumando: as pessoas vão chegando e vão entrando... é assim pra tudo... não adianta reclamar”Não reclamamos. Quando a sorte quis que fosse nossa vez, o senhor olhou nossos passaportes, fez deslizar um formulário sobre a mesa: RE-ENTRY FORM. 


Entendemos que era para preenchê-lo. Perguntamo-nos: por que não nos deram aquele formulário no avião em vez do outro que nos fizeram preencher? Achamos melhor não querer entender: preenchemos tudo de novo e o devolvemos para o funcionário que, num grunhido, nos dispensou. Retornamos ao balcão de imigração, àquela altura já vazio, apenas um funcionário contando uma pilha de formulários. Ao ver-nos chegar, deu uma passada de olhos no que lhe entregamos e, como que tendo um surto, começou a vociferar sabe-se lá o quê e o porquê. Em seguida, resmungando, saiu a passos largos do guichê rumo ao oppice, levando nossos passaportes, nós atrás dele. Lá dentro, o teatro começou: ele folheou um caderno, bateu boca com o senhor sentado à mesa, fechou o caderno, abriu outro, folheou novamente, bateu boca com um terceiro que se intrometeu, até que todos começaram a bater boca entre si, ninguém se entendendo, nós menos ainda. De repente, o surto acabou: saiu do oppice, voltou ao guichê, rabiscou algo no formulário, folheou de novo o passaporte, olhou demoradamente o visto do Sri Lanka tal um colecionador de selos antigos, examinou o da Índia, pesou o carimbo na página, devolveu-nos o passaporte sem nada pedir ou dizer.

Situações análogas a essa, vivemos com frequência na Índia, vide a confusão do hotel à nossa chegada em Delhi: uma questão simples vai se avolumando feito uma bola de neve, acaba virando um imbróglio e, sub-repticiamente, a gente se vê refém de um falso problema, às voltas com um monte de gente metendo o bedelho onde não é chamada. O mais surpreendente é que, no mais das vezes, quando menos se espera, o que se tornou um problema deixa de ser um, dissipando-se como fumaça. Depois que passa, a gente fica tranquilo, mas o problema – este sim verdadeiro - é que, enquanto não passa, tudo pode acontecer. Na Índia, tudo mesmo.

A viagem prosseguiu no melhor dos mundos. Ou quase. Depois da imigração, dirigimo-nos para a conexão rumo a Madurai. Ao descer as escadas rolantes, vimos um francês companheiro de voo – magro, loiro, nariz pontudo, óculos - empurrando o carrinho com sua bagagem, causando-nos estranheza: afinal, não nos asseguraram em Colombo que a bagagem seguiria direto para Madurai? 
- Oui, oui, on m'avait dit ça aussi – confirmou a informação
- Et alors, comment ça se fait? - indaguei procurando entender.- Je ne sais pas... - respondeu fazendo uma careta. E, na ausência de uma explicação plausível, franziu a testa e disse num meio sorriso: C'est l'Inde! 
 
Em que língua fosse, oThat's Índia!” começou naquele momento a ter seu lugar para nós. E dia a dia fomos aprendendo que na Índia o real quase sempre extravasa a nossa expectativa de compreensão. As coisas são e pronto: isso é o que a Índia nos ensina e que o That's Índia!” traduz. 

Se não fosse o francês, nossa bagagem continuaria dando voltas na esteira, e nós, voando sem ela. Um despachante postado a dois metros da mesma, frente a um carrinho abarrotado de malas, informou-nos casualmente ser o encarregado da companhia aérea para reencaminhar as bagagens a Madurai. Ficamos na dúvida: será mesmo? Entre o sim e o não, entregamos a ele e a Ganesha: pelo menos um deles devia saber o que fazia. Para sorte nossa, sabiam: a bagagem seguiu o seu destino. E nós, o nosso: o portão de embarque e a experiência impar do Security check indiano, todo um capítulo à parte.

E fomos adiante, cada passo, um passo. E uma nova barreira de agentes de segurança. Quatro horas de espera na sala de embarque, atraso no voo, mais uma hora, e finalmente boarding piscando no painel: eram 10h50 da manhã, Chennai à luz do dia. No último dos controles, já na pista rumo ao avião, fizeram-nos voltar aos raios X: faltava uma etiqueta, provavelmente caída no chão. Afobados, deixamos a fila, atrás da etiqueta, do carimbo e do valor relativo das coisas: nos raios X o funcionário nem olhou a bagagem, carimbou a etiqueta e continuou a conversar. Corremos de volta à pista, pegamos o ônibus até o avião: estávamos prestes a subir a escada, quando agentes de segurança – terno, óculos escuros e rádio – mandaram-nos de volta ao ônibus, gestos enérgicos, vozes grossas. Tanto controle, tanta correria, suspeita de bomba, pensei. Mais encenação do que qualquer coisa: o avião não era aquele, mas outro pousado a centenas de metros dali, o qual nos fez entrar, sol a pino, em nossa porta da Índia: Madurai.

No caminho de poeira e mormaço do aeroporto ao hotel, meus olhos insones através da janela do táxi, em pleno estado de ofuscação. De certo, a luz embaçada e crua da manhã teve seu efeito, mas a ofuscação que experimentei foi de outra ordem: a da visão, não de indivíduos, seres distintos, separados uns dos outros, mas de um amálgama barulhento e trepidante, fosco e colorido, onde tudo parece revestir-se de terra, e a terra revestir-se de tudo. Se a Índia ofusca é porque ela não se esconde: ela salta-nos aos olhos como uma fera, buliçosa e inquieta. Ela nos mostra os dentes e ruge: I'm not dangerous, I'm intense. But you should be careful, I can be pushing, very pushing.